As Primeiras Imagens Cristãs dos séculos I - II - III

As primeiras imagens da vida da Igreja datam dos séculos I - II - III, do período da Igreja dos Mártires - do ano 30 a 313 -, do tempo de Nero, responsável da morte dos Apóstolos Pedro e Paulo. Paulo foi decapitado e Pedro morreu crucificado.
A Nero sucederam Vespasiano, Tito, Domiciniano e Trajano (98-117) que, no décimo primeiro ano do seu reinado, conduziu Inácio, bispo de Antioquia, a Roma para o entregar às feras.
Posteriormente, na época de Marco Aurélio (161-180), concretamente em 177, foram mortos os célebres mártires de Lyon.

ARTE FUNERÁRIA
Por causa da situação política adversa que prevalecera nos três primeiros séculos do Cristianismo, a arte e respectivas imagens são quase todas de carácter funerário: monumentos funerários, inscrições, grafitos e sarcófagos esculpidos formam o principal conjunto de testemunhos da iconografia cristã antes de Constantino e do Édito de Milão de 313.


De certa forma era natural que a arte destes tempos assumisse o carácter funerário, porque os cristãos deste período viviam muito próximos da morte, quer natural, quer na sequência do martírio, que para eles era a porta e o primeiro passo para a vida futura, a pátria celeste.

Catacumbas de S. Calisto



CATACUMBAS
Durante o primeiro século, os cristãos de Roma não tinham cemitérios próprios. Cristãos, hebreus, e pagãos eram sepultados lado a lado sem qualquer discriminação de raça ou religião. Por outro lado, a lei romana garantia a integridade de todas as sepulturas.

Contudo os Cristãos, como corpo único e organizado, bem depressa adoptaram a ideia de uma Comunidade de fiéis que permanecesse unida para além da morte. Como crentes convictos na ressurreição do corpo, os cristãos praticavam a inumação e escavavam nos estratos do tufo, fora da cidade de Roma, galerias subterrâneas, onde conseguiam amplos espaços para sepultarem os seus mortos. Assim nasceram as Catacumbas.

Ao não possuirem cemitérios próprios, a maior parte dos cristãos de Roma foram enterrados em necrópoles comuns, ao ar livre, junto aos pagãos. Assim S. Pedro foi sepultado na necrópole da Colina do Vaticano, debaixo da actual basílica e S. Paulo na necrópole situada ao longo da Via Ostiense.

Outros Cristãos do século II, que dispunham de propriedades privadas, enterravam os seus mortos em túmulos de família, escavados em vilas e quintas de gente nobre, convertida ao cristianismo, cujos proprietários colocavam as suas propriedades à disposição dos seus irmãos na fé. Pertencem a este período alguns cemitérios em Catacumbas, cujos nomes recordam os seus proprietários e benfeitores: Priscila, Domitila, Lucina, etc.

Com o aumento do número dos cristãos, durante o século III, algumas catacumbas ficaram nas mãos da Igreja de Roma, passando a ser administradas directamente por ela. Mereceu particular relevo as Catacumbas de S. Calisto que, ainda hoje, atraem grande número de visitantes.

Ao falarmos das sepulturas dos cristãos, utilizámos o termo “necrópole”. Em rigor, não devia ser assim. Importa, pois, estabelecer uma distinção entre a concepção cristã e pagã, deste conceito. Os pagãos chamavam aos seus cemitérios “Necrópoles”, isto é, “cidade dos mortos”. Os cristãos, pelo contrário, preferiram a palavra “cemitério”, termo inventado por eles, derivado do verbo grego “koimáo”, que significa “dormir”. Ao utilizarem este termo, afirmam claramente a sua fé na ressurreição: O cemitério era, apenas, o lugar do sono à espera da ressurreição dos corpos. Isto explica também porque os cristãos gostam de chamar ao dia da morte “dies natalis”, isto é, o dia do nascimento para o céu, para a vida eterna.

Cripta de Sta. Cecília - Catacumbas de S. Calisto

ICONOGRAFIA DAS CATACUMBAS
Depois do enquadramento político e religioso do tema que nos ocupa, iniciamos a análise da iconografia cristã do tempo das catacumbas, cujas primeiras imagens remontam aos finais do século II e começos do III. Como referimos, são de natureza quase exclusivamente funerária e sempre inspiradas em textos bíblicos.

Predominam duas figuras simbólicas: “O Bom Pastor”, símbolo de Cristo Salvador e “A mulher orante”, figura da alma salva e já na paz divina.

O BOM PASTOR


A passagem evangélica que causou maior impressão nas pessoas dos primeiros cristãos coincide com a parábola da ovelha perdida (Lc 15, 3-7) e o discurso em que Jesus se apresenta como o Bom Pastor (Jo 10,1-16), porque nenhum outro texto explicava melhor o preço pago por Cristo para salvar os seres humanos. Para Santo Ireneu “a ovelha perdida era o homem”.

A imagem do Bom Pastor é aquela que mais vezes aparece nos Cemitérios de Roma; Mons. Martimort descobriu 114 exemplares. Surge representado em pinturas, nos sarcófagos ou em lápides sepulcrais. Algumas vezes o Bom Pastor aparece isolado com a ovelha sobre os ombros mas, na maior parte dos casos, representa-se no meio do rebanho (as almas bem-aventuradas), ocupado nas acções da pastorícia.

O Bom Pastor - Catacumbas de Sta. Priscila


Atente-se nesta imagem do Bom Pastor, da lápide Apuleya Crisópolis da catacumba de S. Calisto: Jesus, o Bom Pastor, em plena juventude; com a cabeça ligeiramente inclinada para a direita; leva túnica curta, ajustada pelo cinturão; o ombro direito a descoberto; os pés calçados com botas.

O simbolismo desta composição é claríssimo: na figura representa-se Jesus Salvador e na ovelhinha, bem apanhada pelas patinhas e com o rosto virado para o Pastor, alude-se à alma salva por Ele.

O Bom Pastor - Catacumba de S. Calisto
Noutro fresco da mesma Catacumba de S. Calisto aparece um magnífico Bom Pastor que sustém com a mão esquerda a ovelha que leva aos seus ombros, enquanto com a direita segura o pote do leite e um cajado. Junto do Bom Pastor estão outras duas ovelhas.



A FIGURA ORANTE
“Esta figura, representada com os braços abertos nasceu na arte cristã em simultâneo com o Bom Pastor. Não pretende representar uma pessoa defunta determinada, nem a imagem dos vivos que rogam pelos seus mortos, mas a imagem da alma no estado de bem-aventurança depois da morte. O Orante é a personificação da Paz cristã na visão beatífica”, como afirma L. de Bruyne

Catacumbas de Priscila

Catacumbas de S. Calisto


SACRAMENTOS DE INICIAÇÃO CRISTÃ
Depois das imagens do Bom Pastor e do Orante, as cenas que alcançaram maior êxito na iconografia paleocristã relacionam-se com o “Baptismo” e a “Eucaristia”, isto é, os meios com que se alcança a salvação que é dada por Cristo.

O BAPTISMO
Conforme o ensino dos Santos Padres, o Baptismo de Jesus é prefigurado em cenas do Antigo Testamento: no milagre de Moisés ao golpear o rochedo para que o povo hebraico pudesse apagar a sede.
Também o Baptismo de Jesus é uma prefiguração do Baptismo cristão

Moisés golpeia a rocha e brota água - Catacumbas de S. Calisto

Moisés golpeia a rocha e brota água - Catacumbas de Priscila

Baptismo de Jesus - Catacumba de Marcelino e Pedro

Baptismo de Jesus - Catacumbas de S. Calisto



A EUCARISTIA
Antes de mais impõe-se que se diga: a instituição da Eucaristia, tal como aparece narrada em Mt 26, 26-28, nunca  foi representada directamente na arte pré-constantiniana, se bem que aparece de quando em quando sob o símbolo de “Refrigerium” - Refrigério -, no qual os elementos do pão e do vinho estão sempre presentes; algumas vezes encontra-se também o peixe.

Quanto aos comensais, regra geral, mantém-se o número de sete. Na frente, está disposto idêntico número de cestos, numa alusão directa ao milagre da multiplicação. Esta descrição ajusta-se perfeitamente à imagem que apresentamos da cena da “multiplicação dos pães e dos peixes” (prefiguração da Eucaristia), da primeira metade do séc. III, que se encontra no cubículo dos Sacramentos de S. Calisto.

O Banquete Eucarístico - Catacumbas de S. Calisto


O Banquete Eucarístico - Catacumbas de Priscila

O Banquete Eucarístico

O Banquete Eucarístico

Na Cripta de Lucina de S. Calisto deparamos com uma das imagens mais antigas e mais belas da eucaristia: “Dois Peixes Eucarísticos”. No fundo da parede há dois Peixes, um em frente do outro, levando sobre o dorso, um cestinho de vime com 5 pães. Esta imagem é também uma alusão ao milagre da multiplicação dos pães e dos peixes.



Mas há mais. Ambos cestos contêm, debaixo dos pães, um copo com vinho tinto. O simbolismo eucarístico não podia ser mais evidente e explícito:
- o pão e o vinho,
- consagrados na Eucaristia,
- convertem-se em ΙΧΘΥΣ (Peixe),
- isto é, no Corpo e Sangue de
- “Jesus Cristo, Filho de Deus, Salvador”, tal como aparece num dos cubículos de S. Calisto. Nas cenas do Baptismo de Cristo, adverte-se a presença da pomba.



Como exemplos desta cena apresentamos “O pescador e Jesus baptizado por João Baptista no Jordão”, do cubículo dos Sacramentos de S. Calisto e o “Baptismo de Cristo”, com a pomba.





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Ι
ησοῦςIēsousJesus
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Χ
ΧριστόςChristosCristo
I
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ΘεοῦTheou
Filho
X
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E
Σ
ΣωτήρSōtērSalvador






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